A queda da União Soviética (URSS) em 25 de dezembro de 1991teve como consequência a ruptura do que restava da então “cortina de ferro” e mudanças geopolíticas, econômicas e de modo mais profundo na relação entre países.

Os Estados Unidos perdiam a sua referência e conquistava o posto de única superpotência mundial econômica e principalmente militar. Na Europa, agora sem a pressão constante de Moscou, o multiculturalismo e a ideia de países sem fronteiras ganharam força. O projeto da União Europeia finalmente poderia avançar sem maiores dificuldades e, se bem-sucedido, traria estabilidade e prosperidade.

Neste contexto iniciava o período que conhecemos hoje como globalização, impulsionado pelas sociais-democracias mundo afora.

A era Reagan-Thatcher terminara, políticos com carácter conservador/liberal já não serviam mais, afinal, junto com o Papa João Paulo II haviam feito o “trabalho sujo” e acelerado o fim da URSS.

A ordem era passar a narrativa de que o comunismo acabou e, portanto, o extremo também deveria ser evitado. Finalmente uma geração sem guerras, sem fome e pronta para o século XXI, o caminho estava livre para a remoção de ideologias e ideais que causaram tanta destruição no século XX que, em resumo, terminava muito bem levando em consideração as profundas turbulências vividas nos últimos 90/100 anos.

Barreiras comerciais foram caindo e até o McDonald’s e a Coca Cola eram encontrados nas ruas de Moscou.

Ficou mais fácil viajar, se comunicar, consumir e a integração cultural dos povos era questão de tempo, enfim esse é um resumo daquilo que chamamos de globalização.  Em 25 de dezembro de 1991 uma nova ordem mundial fora estabelecida, mas será que todos estavam dispostos a aceitá-la?

Culturas milenares e crenças religiosas não podem ser ignoradas e sempre foram um empecilho para a imposição de novas ordens, desta vez não seria diferente.

Afinal de contas, o que pode interessar a um agricultor brasileiro se as fronteiras da Europa caíram? Por que aldeão do Quênia deveria se preocupar com a diversidade cultural da Nova Zelândia?

Problemas práticos, mas persistentes foram ignorados durante os últimos 30 anos em nome da globalização, além de uma perseguição implacável aos religiosos e pessoas simples. Vide a tentativa de corroer os valores familiares e patrióticos.

A União Europeia é o caso mais emblemático onde decisões que podem afetar uma família do interior do País de Gales agora eram tomadas em Bruxelas por burocratas que nunca colocaram os pés naquele país, portanto sem o mínimo conhecimento necessário para lidar com as questões regionais.

E a ONU? Recheada de acordos e diretrizes que implicam na vida e cotidiano de milhares de pessoas diariamente.

Ainda é prematuro afirmar que 2022 marca o fim da globalização, mas para entendermos melhor essa questão, precisamos analisar outro ano, o ano de 2016.

Em 2016 os britânicos votaram pela saída de seu país da União Europeia no que ficou conhecido como o BREXIT (abreviação em inglês das palavras Britânia e saída, ou seja, Britain Exit) em um claro sinal de rejeição à ordem imposta a partir de 1991.

Em novembro daquele mesmo ano, os americanos elegeram Donald Trump como presidente derrotando a candidata que mais personalizava a globalização: Hillary Clinton.

Estes dois eventos somada a vitória do presidente Jair Bolsonaro em 2018 foram mensagens fortes e claras. A globalização não estava devidamente consolidada e o homem comum não havia se integrado nesta “aldeia global”.

Os eventos do dia 24 de fevereiro de 2022, ou seja, a tentativa de Vladimir Putin e da atual Rússia reconstruir o império russo com porções da União Soviética (sim aquela mesmo que capitulou em 1991) serviram como um verdadeiro choque de realidade para os governantes mundo a fora alinhados com a ideia de um mundo globalizado.

Desde então, o que estamos assistindo é uma corrida dos países e cada um com seus interesses.

Vamos a alguns deles:

A Finlândia deve abandonar seu status de neutralidade secular e ingressar na OTAN (Organização do tratado do atlântico norte).

Países do leste europeu estão buscando se armar para evitar que sejam a próxima Ucrânia.

O Japão vai aumentar consideravelmente sua capacidade militar.

O Canadá baniu a empresa de tecnologia chinesa Huawei por receio que seus cidadãos sejam espionados.

A Alemanha anunciou que vai aumentar os gastos com defesa.

O McDonald ‘s encerrou as suas atividades na Rússia, e isso é muito significativo, pois é um dos símbolos do final da guerra fria e foi justamente a abertura da rede de lanchonetes americana no país.

A Suécia também anunciou que pretende entrar para a OTAN. Além disto, a Suécia juntamente com a Dinamarca anunciou que estão revendo a sua política de imigração com a primeira-ministra sueca admitindo publicamente que o multiculturalismo não funcionou. Vale ressaltar que o multiculturalismo é um dos pilares da globalização, e é muito emblemático que a Suécia tenha tomado tal decisão, tendo em vista que o país escandinavo foi um dos que mais representou a visão da política social-democrata e da globalização em si.

Estes são apenas alguns exemplos de atitudes tomadas pelos países desde 24 de fevereiro. O mundo de utopias da globalização exigia a aparência de estabilidade e prosperidade e de que problemas globais poderiam ser resolvidos com soluções globais, via ONU.

O mundo real é um pouco diferente do imaginado nos corredores da ONU, bastando uma ameaça um pouco mais séria e a atual ordem mundial foi colocada em discussão e cada país tratou de cuidar de seus interesses conforme suas necessidades e particularidades.

Casos também emblemático são os da Índia e Hungria. Em reunião do G7 (grupo das 7 principais economias do mundo formado por Estados Unidos, Itália, Canadá, Japão, Reino Unido, Alemanha e França) foi publicada a preocupação com a real possibilidade de uma escassez global de alimentos como consequência da guerra na Ucrânia.

Indianos e húngaros previram com antecedência tal possibilidade e independente de qualquer decisão da ONU ou outra entidade, já tomaram a sua decisão e buscam garantir alimentos para a sua população, proibindo a exportação de trigo.

Em 2022 o modelo da globalização levou uma pancada forte em seus fundamentos frágeis e artificiais e, ainda sem um resultado geopolítico definido no combate da Ucrânia somada a ambição chinesa de ampliar o BRICs, devemos nos questionar se 2022 pode marcar não o começo do fim, mas o fim do começo da globalização.

Senhoras e senhores o debate está aberto.