Nos meios intelectuais e acadêmicos é muito comum tratar a Idade Média como um período supersticioso, um tempo de rebaixamento da inteligência, de ignorância e de trevas. Chamar alguém de medieval tranformou-se em um xingamento, querendo dizer que se trata de uma pessoa retrógrada, obtusa.

No entanto, apesar dos pensadores modernos – aqueles dos séculos imediatamente posteriores à Idade Média – terem sido muito críticos em relação a ela, talvez surpreenda saber que o principal conteúdo de suas críticas não era uma eventual superstição medieval mas, pelo contrário, o excesso de razão e aristotelismo que caracterizava as obras daquele período.

Os modernos viam no medievo um tempo de excessiva racionalidade teológica, de lógica árida e de abstracionismo persistente. E, de fato, tinham alguma razão em sua crítica, afinal, a Idade Média, principalmente no período final da Escolástica, caracterizou-se por debates que beiravam a inutilidade, com sutilezas impalpáveis e estéreis, como, por exemplo, a discussão se a um anjo era possível sentar na ponta de uma agulha.

O outono medieval carrega uma tradição acadêmica já muito bem estabelecida, com pensamentos elaborados e complexos, mas que, de fato, já estavam desapegados da realidade, chegando a tornar-se quase herméticos. Por isso, o Renascimento, que pode ser considerado uma pré-modernidade, representa o início de tempos nos quais as investigações começam a se preocupar com questões mais palpáveis, mais conectadas com a vida cotidiana, mais voltadas para a natureza e para o homem – é o período do humanismo.

Portanto, a crítica que os modernos fizeram aos medievais não se mostra como um desdém por aquilo que consideravam inferior, mas parecia mais com uma revolta contra a sensação de opressão sufocante causada por uma racionalidade superior. Longe de ser um levante contra as trevas da ignorância, tratou-se de um grito por liberdade em relação aos grilhões dos rigorosos raciocínios medievais.

Como a própria crítica moderna deixa claro, a Idade Média não foi um período de sacerdotes ignorantes e fanáticos, mas, um tempo de razão, e de razão até em excesso.