Conhecer o aspecto eleitoral de um dos países mais importantes da Europa, é fundamental para que em 2022, o PHVox siga na sua função de informar ao público brasileiro sobre os desafios geopolíticos presentes.
Com a eleição francesa chegando, coube a mim realizar a feitura deste texto sobre o processo eleitoral e seus principais atores.
A França, bastião da cristandade ocidental, por sua defesa da fé e pela antiguidade de seu reino (como Portugal), tem uma força simbólica indispensável para a análise geopolítica e o cenário europeu, como um todo.
A França de S. Luís, S. Dinis de Paris (recomendo uma rápida pesquisa sobre sua história); as Cruzadas, as heresias, o Reino Franco. O hexágono é um monumento civilizacional, mesmo, recentemente, na Primeira e Segunda Guerras (apesar do Regime de Vichy), foi resistente à invasões culturais, e sempre difundiu seus valores além da francofonia.
A não-citação da Revolução Francesa não foi mero acaso, recomenda-se a leitura da obra de Plinio Correa de Oliveira, Revolução e Contra-Revolução, e o modelo atual de Estado Francês decorre desta mesma revolução, como é descrito nos próximos parágrafos.
O SISTEMA ELEITORAL FRANCÊS
Neste ano, teremos eleições gerais na França, em 10 de abril de 2022 para Presidente da República, e também eleições para a Assembleia Nacional (o Parlamento) em que são eleitos os deputados, em junho. Os senadores são eleitos por delegados (que podem ser vereadores, prefeitos ou conselheiros regionais – como deputados estaduais), formados pelos políticos eleitos em sufrágios regionais.
As eleições regionais elegem os delegados gerais de cada departamento.
A França tem 101 departamentos (incluindo 5 no exterior).
Na França, o poder executivo é pertencente ao governo (primeiro-ministro) e ao Presidente da República. Já o legislativo, é dividido entre a Assembleia Nacional e o Senado.
O voto pelo correio foi abolido em 1975, por medo de fraude; o único caso permitido é para o voto dos franceses que moram no exterior, em que de 20 a 25% dos votos não são computados (na média) por problemas no preenchimento.
Os 577 deputados que compõem a Assembleia Nacional são eleitos por cinco anos em dois turnos. O candidato que obtiver a maioria absoluta dos votos válidos ou um total de votos igual a 25% do eleitorado registrado é eleito no primeiro turno.
Se nenhum candidato atingir esse limite, um segundo turno é realizado entre os candidatos que receberam um total de votos igual a 12,5% do eleitorado. O candidato que receber mais votos no segundo turno é eleito.
A eleição para a Assembleia Nacional será realizada em 12 de junho, e as 577 cadeiras estarão em disputa, sendo assim, necessário que um partido conquiste 289 cadeiras para formar o governo sem a necessidade de coalizão. Como a eleição é em dois turnos, nada pode ser definido por enquanto, por isso a eleição de presidente é importante.
A ELEIÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA FRANCESA
O Presidente da República Francesa é eleito por um período de cinco anos, renovável apenas uma vez. Ele é eleito pelo voto direto, em dois turnos, um seguido do outro com diferença de 14 dias.
No primeiro turno, busca-se a maioria absoluta (é preciso ter 50% dos votos mais um). Se nenhum candidato o obtiver, são mantidas as duas melhores pontuações que restam para o segundo turno.
No segundo turno ganha quem obtiver a maioria relativa, é preciso simplesmente ter mais votos que o outro.
QUAIS SÃO OS PODERES DO PRESIDENTE FRANCÊS?
O presidente representa o país para o exterior, fala em nome da França e de todos os franceses. É ele quem se encontra com chefes de estado estrangeiros e assina acordos entre países (leia-se União Europeia);
- nomeia as altas funções do Estado: o Primeiro-Ministro e os embaixadores;
- ele pode pedir a todos os franceses que votem fora dos períodos eleitorais em um referendo ou em caso de dissolução da Assembleia Nacional, poder também assegurado ao cargo.
- ele é o chefe do exército. Ele decide enviar ou não soldados para um país em guerra. Ele também é o único que pode dar a ordem de uso de armas nucleares. Na verdade, ele é o único com acesso a Júpiter, o posto de comando nuclear, cuja localização exata é mantida em segredo.
Depois de ter nomeado o seu primeiro-ministro (que não é escolhido pelo parlamento, mas sim pelo presidente, por isso a França é semi-presidencialista), igualzinho estão querendo fazer num país aí.
Junto do premiê, escolhe os ministros que constituem o seu governo. Cada ministro tem um ministério ou uma administração e trabalha com sua própria equipe. Seu número varia de acordo com os presidentes; atualmente, existem 17 ministérios.
Todas as quartas-feiras, o presidente e os ministros se reúnem no Palácio do Eliseu (residência oficial da presidência) para fazer um balanço da semana. Este é o Conselho de Ministros.
O GOVERNO CRIA AS LEIS?
Diz-se que o presidente promulga as leis. Isso significa que ele deve ter assinado uma lei para que ela seja aplicada. O presidente e seu governo também podem propor leis. Mas é a Assembleia Nacional que vota neles.
Se a assembleia não estiver do seu lado, deve escolher um primeiro-ministro que pertença à maioria. Isso é chamado de coabitação. A última coabitação durou 5 anos, de 1997 a 2002. Jacques Chirac (da UMP) foi Presidente e Lionel Jospin (do Partido Socialista), primeiro-ministro.
O Presidente tem o direito de “dissolver” a Assembleia Nacional: despede os deputados antes do fim dos seus mandatos. É uma arma poderosa que o presidente raramente usa. Isso lhe permite provocar novas eleições legislativas e verificar se os franceses continuam do seu lado ou não. O presidente Chirac fez isso em 1997, não funcionou.
Principais partidos e candidatos
Les Républicains: O Partido “Os Republicanos” fundado em 2015 é um sucessor da UMP (União Para um Movimento Popular), que, por sua vez, é sucessora de outro partido, o RPR, enfim. É o partido gaullista por definição. Gaullista é o adjetivo que se dá ao partido por ter sido a base de apoio do Presidente Charles de Gaulle durante seu período de governo. Se identifica como centro-direita, porém, nos mandatos de Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy, teve um caráter globalista pró-europeu. É o partido francês do sapatênis.
Nas eleições de 2017, o então candidato François Fillon, foi considerado um dos favoritos, por ser um político experiente (algo relevante para os franceses) e por estar na dianteira das pesquisas. Entretanto, com a crise do Penelopegate (ele teria empregado sua esposa, Penelope Fillon, como funcionária fantasma de seu gabinete), suas chances foram destruídas.
Sua candidata nestas eleições é Valérie Pécresse, presidente do conselho regional da região Île-de-France desde 2015, numa região onde fica localizada Paris e que é um histórico bastião do Partido Socialista. Foi ministra da pesquisa e do orçamento no governo Sarkozy-Fillon. Tem 54 anos, três filhos, fala francês, inglês, russo e japonês. É uma das favoritas a ganhar o pleito.
Foi contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, em 2013, junto com Fillon, chegando a participar de manifestações contra a lei que o aprovou naquele mesmo ano. É contra o passe vacinal, mas os integrantes de sua campanha são a favor, como Éric Ciotti.
PS (Partido Socialista): É o partido mais antigo da França, fundado em 1905, define-se como o partido da social-democracia francesa é filiada à Internacional Socialista.
O partido vem perdendo força nos últimos anos principalmente depois do desastroso governo François Hollande, que foi o único presidente francês que não se candidatou à reeleição desde a Segunda Guerra Mundial, devido à sua grande impopularidade.
Sua candidata nestas eleições é Anne Hidalgo, 63, que atualmente é a prefeita de Paris desde abril de 2014. Lembre-se que a eleição para prefeito na França é feita pelos vereadores.
Esta é a prefeita que liberou a construção de um arranha-céus em Paris (algo proibido por lei), a pedido de um grupo bilionário chamado Louis Vuitton. Lá os Socialistas andam de mãos dadas com os “Capitalistas”. Acontece. Suas chances são baixas de passar do primeiro turno. É a favor do passe vacinal.
RN (Reunião Nacional): Fundado em 1972, nacionalista e de direita, foi o partido que mais se opôs às políticas da União Europeia e anti-imigração na França.
A “velha mídia” francesa tenta enquadrar o partido como “de neonazistas”, por ter havido declarações antissemitas pelo seu antigo presidente, Jean-Marie Le Pen, que é um falastrão. Mas foi com sua filha que o partido ganhou uma maior aproximação com o setor mais conservador do eleitorado francês.
Em 2017, bateu na trave, ao “quase” ganhar o primeiro turno, e perder de 66% a 34% para Macron. É seu teto eleitoral.
O partido tem chances de chegar ao segundo turno com Marine Le Pen, 53, buscando um discurso mais moderado, e menos russófilo, mas sempre há o risco de não ganhar no segundo turno, como ocorreu em 2017. É veementemente contra o passe vacinal.
Reconquête (Reconquista): Fundado há um mês, em dezembro de 2021, é o mais novo partido da França, com visões liberais na economia e anti-imigração.
Seu candidato é o escritor, Éric Zemmour, 63, proponente da “Teoria da Grande Substituição”, em que as elites europeias estariam tentando substituir a população cristã europeia (da França, nomeadamente), por uma população muçulmana, via imigração em massa.
É a grande surpresa da eleição, por ter chances de chegar ao segundo turno, com um candidato que nunca foi político, e que teve um crescimento exponencial nas pesquisas. É contra o passe vacinal.
FI (França Insubmissa): é um partido recente, fundado em 2016, e é comparado a uma versão de esquerda da Frente Nacional. E é o partido de um homem só. Tem uma visão ecossocialista da política.
É a base de apoio de Jean-Luc Mélenchon, 70, que conseguiu quase 20% do eleitorado no primeiro turno em 2017. Seu desempenho foi bem superior ao do Partido Socialista, mesmo defendendo estatização de bancos, e aumentos de impostos.
Se ele tiver chances de ir ao segundo turno, é possível que ocorra com ele, o que ocorreu com Marine Le Pen em 2017, dado que, seu teto deve ser de no máximo 30% do eleitorado. É a favor do passe, mas pode ser contra (tudo depende do humor dele).
EELV (Europa Ecológica Os Verdes): Fundado em 2010 é o sucessor do Partido Verde francês. Hoje é um dos partidos relevantes no cenário nacional, mas são improváveis as chances de ir ao segundo turno, inclusive por seu efusivo apoio à integração europeia, não muito bem quista na França, mesmo hoje.
É um partido que recebe votos dos jovens e ganhou certa relevância com as duas últimas eleições (para presidente e regionais), por ter eleito vários políticos nos departamentos franceses.
O candidato do Partido Verde é Yannick Jadot, 54, era a favor de impostos maiores para combustíveis, o que foi a causa dos projetos dos “coletes amarelos”, voltou contra sua posição, dada a força do movimento. É a favor do passe vacinal e da vacinação obrigatória.
E por último, e não menos importante:
LREM (A República em Marcha): Fundado em 2016, um ano antes da eleição do atual mandatário da França, é o partido de Emmanuel Macron e o maior em representação na Assembleia Nacional.
Macron, 44, ainda não disse se será candidato ou não. É uma incógnita até o momento em que é escrito este artigo. É um candidato impopular, mas, a depender de quem for para o segundo turno, pode continuar no cargo.
É o candidato preferido da troika, é a favor da obrigatoriedade da vacina e do passe vacinal, que propôs em janeiro de 2022. Tem uma taxa de apoio superior a de seu antecessor, tornando-o num candidato viável à reeleição.
Mas como foi dito: ainda não é candidato.
Estes são os principais protagonistas das eleições francesas de abril e o PHVox não irá medir esforços para trazer a melhor cobertura e análise desta importante eleição que pode definir os rumos da União Europeia para os próximos cinco anos.