O poder de alguém sobre vida de outro depende, principalmente, dos meios para garantir que a ordem seja executada e da presença ativa da autoridade para manter a obediência. Vários são os recursos garantidores do poder, até décadas atrás eram a soma da força física dos exércitos e do poderio bélico, hoje os instrumentos são sutis, silenciosos por essência. O poder de criar e impor leis, a autorização para suprimir direitos e a posse dos meios de informações em massa substituíram a coerção física; já os recursos tecnológicos deixaram os “súditos” mais submissos que nunca, graças à ostensiva vigilância.

Notem que todas essas ferramentas fazem parte dos mecanismos do chamado estado democrático e requerem um certo jogo de concessões mútuas entre os vários personagens, tanto os mandam quanto os que obedecem, para que funcionem suavemente. Para amaciar o sistema e evitar traumas e solavancos, o alinhamento ideológico é peça chave nesse processo, e é exatamente a partir daí que surgem os esforços para mudar o referencial coletivo. Quando digo referencial, quero dizer a perspectiva pela qual alguém irá enxergar as coisas e, partir dela, tomar decisões; é a “noção de encaixe da vida humana numa totalidade” [1].

Junto com o Estado Moderno vieram equivocadas ideias que priorizam as mais diversas formas de organizações e concepções de mundo em prejuízo à caluniada instituição família, relativizaram os valores necessários à sua estabilidade e a percepção da sua imprescindível função para a vida em comunidade foi apagada do imaginário. O referencial família foi substituído, juntamente com todo o seu ecossistema de ideias, por conceitos subvertidos que afastam as pessoas da realidade e as prostam diante dos tiranos reestilizados. Qual é a maior ocupação atualmente, é o trabalho, é a política, são as redes sociais, é o meio ambiente, é a ciência ou é a família? O ordenamento das prioridades representa a hierarquia dos referenciais que marcam a direção a ser percorrida.

Família certamente é a instituição mais antiga que existe, muito anterior às atuais formas de organizações da sociedade. Concebida por Deus (Gn 2:24), é o mais nobre esforço de convivência baseado no afeto e na graça de Jesus Cristo, o símbolo de união. É no seio familiar que se aprende e transmite os valores carregados pelo resto da vida e é o ambiente em que o homem se mostra na mais autêntica e transparente forma, verdadeira incubadora de virtudes.

Os demais aspectos da vida são importantes e não devem ser negligenciados, mas a intensidade de tais experiências são superficiais e precárias, suscetíveis a desistências ou interrupções. Muito pouco ou praticamente nada se pode fazer, por exemplo, na política, mas quanto pode ser feito por um filho ou cônjuge! Nos momentos de fragilidades e dificuldades, ninguém recorre à distante sociedade ou ao departamento do órgão “x” ou “y”, as crises são resolvidas com o suporte dos familiares e pessoas verdadeiramente próximas.

O que quero mostrar com toda essa conversa é que há muita distração propositadamente colocada para retirar o foco do que é importante, que é a família para a vida humana. Quanto mais longe da família, mais próximo, psicologicamente e afetivamente, estará do burocrata que nunca te viu, mas sabe exatamente o que planejou para o seu futuro.

[1] Olavo de Carvalho. O saber e o enigma, pg. 93