A OFAC renovou por mais seis meses a licença número 41 que permite à Chevron manter as suas operações na Venezuela, apesar de os EUA terem assumido a liderança da pressão internacional sobre Nicolás Maduro para aceitar a sua derrota nas eleições, mas abster-se de atacar o regime onde lhe dói. O que está por trás dessa decisão?
A política dos Estados Unidos em relação à Venezuela está presa entre a defesa da democracia e os interesses econômicos das empresas petrolíferas que fazem lobby junto à Casa Branca para que o governo de Joe Biden lhes permita continuar a operar no país sul-americano. A razão é muito simples. Empresas como a americana Chevron e a espanhola Repsol procuram recuperar com petróleo pelo menos parte dos 750 milhões de dólares e 200 milhões de euros que a PDVSA lhes deve, respetivamente. Esta é a razão pela qual o Gabinete de Controlo de Ativos Estrangeiros (OFAC) renovou esta quarta-feira por mais seis meses a licença número 41 que permite à Chevron manter as suas operações na Venezuela, apesar de os Estados Unidos terem assumido a liderança da pressão internacional sobre Nicolás Maduro para que este aceite a sua derrota nas eleições, prometendo uma nova onda de sanções que na prática não vai além do confisco de bens e do cancelamento de vistos, que, por serem penas individuais, não provocam em Miraflores o tsunami necessário para quebrar os fundamentos do regime.
Embora a licença da Chevron – que é automaticamente renovada semestralmente se não houver decisão em contrário – permanecerá válida até pelo menos abril de 2025, permitindo à empresa manter operações limitadas no país sem que isso resulte em royalties para o Estado venezuelano, a liderança chavista não perde a oportunidade de apresentar este fato como um triunfo perante a opinião pública. E embora a empresa possa extrair petróleo e seus derivados do território venezuelano para exportá-los aos Estados Unidos, bem como adquirir bens ou insumos relacionados para essas operações, está proibida de pagar impostos, royalties e dividendos ao regime, bem como vender petróleo bruto ou seus derivados produzidos por ou através das joint ventures para qualquer jurisdição que não seja os EUA.
A relação conveniente entre Chevron e Maduro
É importante lembrar que a Chevron – com um século de operações na Venezuela – é a única petrolífera norte-americana que decidiu permanecer no país depois da Exxon Mobil e da ConocoPhillips terem deixado o território venezuelano em 2007, após não terem conseguido chegar a um acordo com o então governo de Hugo Chávez, que obrigou as empresas transnacionais a associarem-se à PDVSA em empresas mistas nas quais a estatal venezuelana teria sempre que ter a participação maioritária. Apenas a Chevron aceitou os termos e acabou firmando parceria com a PDVSA em quatro projetos: Petropiar, Petroboscán, Petroindependencia e Petroindependiente, sendo os dois primeiros os mais representativos da Chevron por terem 30% e 39,2%, respectivamente. Contudo, no caso da Petroindependencia, a Assembleia Nacional Chavista aprovou em julho uma extensão da atividade da Chevron na Venezuela até 2050 através desta empresa mista.
Desta forma, a Chevron pretende recuperar cerca de 750 milhões de dólares em dívidas não pagas e dividendos que até ao final de 2025 estima em 3 mil milhões de dólares através de um acordo de troca de petróleo por dívida assinado com a PDVSA em 2022, justamente quando Washington concedeu à Chevron o licença recentemente renovada no âmbito dos diálogos entre o regime de Maduro e a oposição iniciados no México. E se fosse incluída a proibição de a Venezuela receber impostos, royalties e dividendos por estas operações, o que ganha Maduro? Por um lado, faz com que o petróleo venezuelano flua para os EUA e, por outro, obtém benefícios para os trabalhadores, o que se traduz em capital político para mostrar uma aparente recuperação econômica, mantendo aberta a possibilidade de lucros futuros.
Embora a licença impeça a Chevron de qualquer expansão de joint ventures em novos campos na Venezuela além do que estava em vigor em 28 de janeiro de 2019, ter reativado os quatro projetos existentes já é um ganho suficiente tanto para o regime quanto para a empresa de energia, uma vez que contribui números importantes para as metas de produção e exportação. Assim, a Chevron passou de produzir 160 mil barris de petróleo por dia em 2023 para cerca de 200 mil em 2024 e estima atingir 250 mil barris em 2025 com a perfuração de 30 novos poços na zona de petróleo bruto pesado do Cinturão do Orinoco.
Pressão ineficaz
O lobby da Chevron para recuperar parte da dívida petrolífera milionária não é muito diferente do da espanhola Repsol, que, juntamente com a italiana Eni, também recebeu autorização do governo dos EUA em 2022 para retomar as suas operações na Venezuela. A defesa da democracia e do respeito pela vontade popular não é algo que tire o sono dos gestores destas empresas, que apenas zelam pelos seus interesses econômicos. No entanto, a política externa da Administração Biden continua muito comprometida na comunidade internacional ao promover, por um lado, uma pressão crescente para que Maduro aceite a sua derrota, enquanto, por outro, cede ao lobby das petrolíferas e evita atingir a ditadura chavista onde mais dói. Isto foi destacado pela internacionalista Giovanna Quina em recente entrevista ao PanAm Post . “O lobby destas companhias petrolíferas não é pouca coisa. “Eles têm muito poder.”
“Não podemos ficar satisfeitos apenas com declarações conjuntas. Devemos agir juntos. “Essa é a única maneira de mudar os cálculos e o comportamento de Maduro”, disse o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, na reunião ministerial sobre a situação urgente na Venezuela no âmbito da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) semana passada. Uma afirmação que, com a renovação da licença da Chevron, para muitos ficou no papel ou simplesmente evidenciou a hipocrisia do governo dos EUA.