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Cuidado com os pacatos!

Foto: manifestação na Av. Paulista, São Paulo- SP, no dia 30 de junho de 2019

Nas eleições de 1982, a esquerda venceu em três estados importantes do Brasil e cresceu em diversos outros.

As reflexões feitas, então, por Plinio Corrêa de Oliveira, em artigo publicado na Folha de S. Paulo, em 14 de dezembro desse ano, ajudam a entender a encruzilhada em que o Brasil se encontra no presente momento:

Deixo de lado aspectos importantes das últimas eleições, como o deslocamento – a meu ver certo – entre o resultado eleitoral obtido e as aspirações da grande maioria do Brasil autêntico. Ou então o papel preponderante do esquerdismo da imprensa (4º Poder) e das sacristias (5º Poder) no fabrico desse resultado eleitoral. Ou, por fim, o papel muito singular dos pruridos esquerdistas nos bairros ricos, e das tendências conservadoras nos bairros pobres. Pois o fato palpável, certo, indiscutível, sobre o qual mais diretamente incide nossa atenção, é esse inegável progresso da esquerda.

Impõe ele duas perguntas elementares, às quais quero responder frontalmente: para onde o progresso da esquerda conduzirá o Brasil? Em face dele, no que consiste o meu dever, e o de tantos que como eu pensam?

Ambas as perguntas comportariam explanações sem fim. Contento-me, pois, em destacar delas um ponto em torno do qual, a meu ver, tudo gira. É ele de índole muito mais temperamental do que ideológica, como, aliás, corresponde ao feitio de nosso povo.

Incontáveis são os brasileiros a quem se persuadiu de que a repressão anticomunista de há muito já “limpou o terreno” entre nós, dos poucos subversivos que restam. Qualquer repressão anticomunista se tornou assim supérflua e inoportuna.

Ora, essas quimeras, essa mesma maioria sentiu delícias em deixar-se persuadir delas. Pois o brasileiro é cordato, e só gosta de assistir discussões e brigas quando não são “para valer” mesmo. Aí elas o encantam. É a hora da torcida, do “fuxico”, da “fofoca”, etc.

“Esquerdismo” significava, para a grande maioria, democracia, oportunidade para falar ou ouvir arengas bonitas, ou então para participar das “fofocas”, dos “fuxicos” e da politicagem.

Colocados na opção entre a carranca, a repressão e a luta, de um lado, a literatura, o “fuxico” e a “fofoca” do outro, grande número de brasileiros preferiu as distensivas diversões do livre jogo político. E por aí vai levando o Brasil.

* * *

O que nos ensina isto? – Que o êxito da esquerda só tem possibilidade de ser durável na medida em que ela o saiba compreender. E, analogamente, o centro e a direita só continuarão a representar um papel marcante na vida brasileira se souberem adaptar-se a tal.

Quero ser ainda mais concreto. Se a esquerda for açodada na efetivação das reivindicações “populares” e niveladoras com que subiu ao poder; – se se mostrar abespinhada e ácida ao receber as críticas da oposição; – se for persecutória através do mesquinho casuísmo legislativo, da picuinha administrativa ou da devastação policialesca dos adversários, o Brasil se sentirá frustrado na sua apetência de um regime “bon enfant” de uma vida distendida e despreocupada. Num primeiro momento, distanciar-se-á então da esquerda. Depois ficará ressentido. E, por fim, furioso. A esquerda terá perdido a partida da popularidade.

Em outros termos, se os esquerdistas, ora tão influentes no Estado (Poderes 1, 2 e 3), na Publicidade (Poder 4) e na estrutura da Igreja (Poder 5), não compreenderem a presente avidez de distensão do povo brasileiro, deixarão de atrair e afundarão no isolamentoFalarão para multidões silenciosas no começo, e pouco depois agastadas.

O Brasil de hoje quer absolutamente pacatez. Se a esquerda vitoriosa não souber oferecê-la, esvanecer-se-á. Se o centro e a direita não souberem conduzir sua luta num clima de pacatez, terá chegado a vez deles se esvanecerem.

Bem concebo que algum leitor exasperado me pergunte: mas, afinal, quem ganha com essa pacatez? – Até aqui não tratei disto. Mostrei que perderá quem não souber ter.

Quem ganhará: a direita? o centro? a esquerda? – Quem conhecer as verdadeiras fibras da alma brasileira e souber entrar em diálogo pacato com essas fibras. Seja governo, seja oposição, pouco importa. A influência será de quem saiba fazer isto.

Insisto. Se o governo, a Publicidade, a estrutura eclesiástica não souberem manter-se no clima de pacatez, e passarem para a violência física, legal ou publicitária contra a oposição, os pacatos lhes dirão: mas, afinal, qual é a sinceridade, qual a dignidade de vocês, que quando eram oposicionistas reclamavam para si liberdade e respeito, e agora que são governo usam da perseguição e da difamação para quem é hoje oposição?

E se os pacatos notarem acrimônia nos de centro e de direita, dir-lhes-ão: está bem provado que é impossível conviver com vocês, porque, nem vencidos, sabem ser de um trato distensivo.

cuidado com os pacatos que se indignam, senhores da esquerda, do centro e da direita. A hora não é para carrancas, mas para as discussões arejadas, polidas, lógicas e inteligentes. Os pacatos toleram tudo, exceto que se lhes perturbe a pacatez. Pois então facilmente se fazem ferozes…

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