PHVOX – Análises geopolíticas e Formação
Artigos

Espontaneidade epicurista e gravidade cristã

Cena contemporânea da vida de família: um casal, em um recanto pitoresco, faz pic-nic com seus filhos. Algo de mal? Mas como! A reunião da família é em si mesma uma coisa excelente. Excelente é também que esta reunião se efetue em lugar ameno e atraente, que proporciona repouso e distração inocente. A pujança da vida doméstica se demonstra pela perfeita união, pela cordialidade absoluta entre todos. Oxalá, dir-se-ia, fosse sempre este o ambiente da vida do lar.

Tudo isto é bem verdade. Entretanto um observador mais fino não se deteria apenas nestes comentários superficiais. Analise-se o riso dos personagens: é rasgado, escancarado, como de pessoas que se entregam sem restrições ao pleno gosto de viver. A idéia de que os prazeres da vida são efêmeros; o homem vive nesta terra para o Céu, e precisa pois gozar com sobriedade os deleites temporais mesmo quando honestos; a idéia de que temos em nós, pelo pecado original, uma natureza frequentemente propensa ao erro e ao mal, a qual necessita, portanto, vigilância constante e mortificação; a noção de que vivemos em uma hora trágica da História, em que a todos cabe arcar com terríveis responsabilidades; tudo isto não marca as fisionomias, os gestos, o ambiente, do menor ou mais leve traço. Viver tão sem peias e sem preocupações quanto os pássaros destas belas árvores, ou os peixes deste lago tranquilo, eis o único desejo que transparece… e de quantos modos!

A ausência de todo e qualquer pensamento sério nestas mentalidades se prova pela atitude dos filhos e dos pais. Nestes, nada da gravidade, da respeitabilidade, que convém à sua autoridade sagrada. Naqueles, nada da reverencia, do respeito, da submissão própria à piedade filial. Estas quatro pessoas não se apresentam aí, umas em relação às outras, tanto como membros de uma família, quanto como excursionistas ligados pela mera e plena camaradagem da excursão.

E quanta gente pensa, hoje, que este é o verdadeiro ideal da vida de família! Ideal de uma espontaneidade naturalista e pagã, pois nele não se nota nada de especificamente sobrenatural e cristão.

Family Portrait (1756) by François-Hubert Drouais

Cena bem diversa nos apresenta o quadro de François Hubert Drouais (1727-1775). É uma família no século XVIII. Não queremos dizer — é claro — que a vida de família nesse século tivesse sido sem jaça. Mas conservava mais tradições cristãs que a de hoje. Assim, nesta família, as atitudes e os trajes exprimem bem as diferenças de sexo e de idade, a fisionomia dos pais é própria a incutir respeito e submissão, tudo nos personagens exprime a harmonia, a força, o equilíbrio de temperamentos governados, controlados, dirigidos por toda uma concepção superior da vida. Há uma tradição de ascese, de mortificação, de saudável e cristianíssima energia moral neste ambiente entretanto tão afável, acolhedor, despretensioso.

Porque esta comparação? Para que nos edifiquemos com os exemplos do passado, para retificar o presente e preparar o futuro. Pois para que serviriam os retrospectos históricos se esta finalidade moralizadora lhes fosse negada?

Pode lhe interessar

Não seja como um urubu

Anderson C. Sandes
22 de setembro de 2023

Os escândalos políticos dos tempos atuais são realmente absurdos!

Marcus L. Chagas
17 de janeiro de 2022

Uma lição a tirar

Plinio Corrêa de Oliveira
14 de maio de 2023
Sair da versão mobile