Quando interagimos com um indivíduo, percebemos as suas várias características, pelo menos as mais evidentes, e chegamos à conclusão se gostamos ou não dele. Isso é um processo bem interessante, porque diante de uma infinidade de traços, nós intuitivamente ou conscientemente os ordenamos de forma a chegar a um juízo de valor. Somos atraímos ou repelidos conforme a importância e o valor que atribuímos a certos aspectos existentes nas pessoas. Valor, portanto, é algo bem relevante.
Na maioria das instituições, sejam públicas ou privadas, há sempre uma área dedicada à exposição dos valores que elas cultuam. Nas profissões e nas diversas áreas vemos a mesma coisa. O cultivo de certos valores ao longo da vida é fundamental, pois afinal, quem fica à vontade, por exemplo, ao lado alguém pedante ou quem tem coragem de render deferência a um político desonesto? Talvez seja melhor deixar essa última parte para lá!
Mesmo sendo importante, pelo menos para mim, há uma certa dificuldade de definir valor. Geralmente busco entender o termo como uma característica humana bem-vista para um determinado grupo e que serve para nortear o comportamento nas mais variadas situações.
Um outro ponto interessante desse assunto é que valores são inescapavelmente aprendidos e seus significados são modificados com o passar do tempo. Então, quais os valores valem a pena ser transmitidos, qual será a hierarquia entre eles e quem está modificando os seus significados?
Há também o fomento aos chamados valores invertidos, ou seja, subversão dos bons e a substituição por vícios morais mascarados de virtudes. Visualizem o diagnóstico do Professor Olavo de Carvalho sobre a atual situação do Rio de Janeiro:
“Entre as causas do banditismo carioca, há uma que todo o mundo conhece, mas que jamais é mencionada, porque se tornou tabu: há sessenta anos os nossos escritores e artistas produzem uma cultura de idealização da malandragem, do vício e do crime. Como isto poderia deixar de contribuir, ao menos a longo prazo, para criar uma atmosfera favorável à propagação do banditismo?
De Capitães da Areia até a novela Guerra sem Fim, passando pelas obras de Amando Fontes, Marques Rebelo, João Antônio, Lêdo Ivo, pelo teatro de Nelson Rodrigues e Chico Buarque, pelos filmes de Roberto Farias, Nelson Pereira dos Santos, Carlos Diegues, Rogério Sganzerla e não-sei-mais-quantos, a palavra-de-ordem é uma só, repetida em coro de geração em geração: ladrões e assassinos são essencialmente bons ou pelo menos neutros, a polícia e as classes superiores a que ela serve são essencialmente más.”[1]
Sempre existiram tentativas de inversão de valores e elas merecem toda a nossa atenção e alertas, conforme Isaías 5, 20-21 e 23:
Ai dos que ao mal chamam bem, e ao bem mal; que fazem das trevas luz, e da luz trevas; e fazem do amargo doce, e do doce amargo!
Ai dos que são sábios a seus próprios olhos, e prudentes diante de si mesmos!
Ai dos que são poderosos para beber vinho, e homens de poder para misturar bebida forte;
Dos que justificam ao ímpio por suborno, e aos justos negam a justiça!
Tentarei ilustrar o caso do valor senso de justiça (no sentido de ser justo, sem relação com a estrutura do poder judiciário): Temos acompanhado repetidos embates sociais e até políticos que usam lentes para reduzir a realidade em estratificação de classes, cujas lutam sempre clamam por soluções relacionadas à justiça (ao modo deles, é claro). A narrativa gira em torno de uma ideia que visa projetar vantagens a determinadas grupos (racial, de sexo, etc) para compensar as ditas injustiças históricas. Percebam que com essa visão, o princípio da isonomia é afetado, pois instaura uma desigualdade jurídica e implicitamente força uma hierárquica entre os valores senso de justiça e tratamento igualitário, além de rotular pessoas e incitar ódio entre elas.
Aproveitando ainda o exemplo, a acepção empregada é uma contradição à justiça cristã, exemplificado na parábola do bom samaritano, narrada em Lc 10, 25-37, o qual o samaritano deu hospedaria e cuidados a um inimigo histórico. Um homem justo, na ótica cristã, é aquele que oferta tratamento digno independentemente de quem esteja clamando por ajuda (tente explicar isso para um revolucionário Marxista, duvido que ele entenda).
Além dos problemas já mencionados, surge a dificuldade de selecionar quais, dentre uma infinidade, devem ser trabalhados. Não ousaria elencar uma lista, mas posso ao menos apresentar as chamadas virtudes cardeais, que são a prudência (sabedoria), a temperança, a justiça e a fortaleza (força e coragem) e as virtudes teológicas, que são fé, esperança e caridade. O exercício dessas sete já um desafio enorme.
Por fim, resta ainda pensar sobre à maneira de buscar a correta concepção e a melhor seleção e hierarquização dos valores, a fim de praticá-los. Para tal, não consigo enxergar caminho que não se inicie no seio familiar, acredito fortemente que trata de um dever da família que se expande para as demais camadas da sociedade.
[1] https://olavodecarvalho.org/bandidos-letrados/ Acesso em 24 de maio de 2022.