Contradição, corrupção, perseguição, conspirações, espionagem. Há de tudo na política venezuelana. Determinar qual desses fatores prevalece sobre o outro é uma tarefa difícil. O que se demonstra concreto é que existem alas dentro do chavismo que querem a derrubada de Nicolás Maduro, sendo o seu ex-vice-presidente apontado como o responsável pelo plano.

Os expurgos (ou purgas) comunistas são bem conhecidos ao longo do tempo. Trata-se basicamente de expulsar e/ou eliminar politicamente, por vezes fisicamente, um aliado político ideológico. Nas fileiras comunistas, este processo é utilizado desde a primeira internacional socialista com o caso entre Karl Marx e Mikhail Bakunin. Stálin e Mao Tsé-Tung são conhecidos por suas diversas purgas. Todavia, da mesma maneira que o comunismo é tratado como algo inexistente atualmente, os expurgos não poderiam ser diferentes.

Hoje na Venezuela, o homem que é a peça principal deste expurgo chama-se Tareck El Aissami, que apesar do nome pouco comum, é venezuelano. Filho de Zaidan El Aissami, mais comumente conhecido como Carlos Zaidan, imigrante da Síria. Seu pai foi líder do Baath iraquiano na Venezuela, sim, aquele mesmo do partido de Saddam Hussein. Carlos Zaidan foi preso em 1992 com Hugo Chávez na tentativa de Golpe de Estado de 04 de fevereiro.

Tareck El Aissami, é advogado criminologista formado pela universidade de Los Andes, onde teve como professor o Sr. Adán Chávez, irmão do finado Hugo Chávez. Em 2005 foi eleito deputado da Assembleia Nacional pelo estado de Mérida. Apesar de sua posse, foi chamado pelo governo para ocupar o cargo de vice-ministro da Segurança Cidadã, que dirigiu de 2007 a 2008, quando Chávez o nomeou ministro do Interior e da Justiça, gestão que assumiu por 4 anos. Além disto, foi governador do Estado de Aragua, membro da direção nacional do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e chegou até mesmo ocupar o cargo de vice-presidente de Nicolás Maduro.

El Aissami é conhecido por ser um repressor eficiente, desde a sua entrada como ministro, foi o indicado como mandante de diversos casos de abuso de autoridade e uso da polícia para perseguição política de opositores, principalmente estudantes. Como governador de Aragua, utiliza as forças policiais para todo e qualquer tipo de repressão, tornando a força sob seu comando a mais violenta e abusiva do país.

El Aissami, também é apontado como um dos principais líderes, ao lado de Diosdado Cabello, do Cartel de Los Soles. O super cartel de drogas opera nas forças armadas venezuelanas, que chegou a escoar 90% de toda cocaína produzida dentro da Colômbia e atualmente é responsável por 25% pelo escoamento de toda a droga distribuída no mundo, segundo a Secure Free Society.

Donald Trump, ainda nos primeiros 30 dias de governo, anunciou sanções contra El Aissami, classificando-o como o “Chefão das drogas”.

Ainda em 2017, Nicolás Maduro nomeou El Aissami como o ministro do Petróleo, área responsável pela sustentação do chavismo, que estava em crise desde 2013, sendo um dos fatores que fez o regime chavista colocar a Venezuela no arcabouço de miséria atual.

Em 20 de março de 2023, Tareck El Aissami, renunciou ao seu cargo por suspeitas de corrupção. O movimento ocorreu dias depois que a Procuradoria-Geral da República e o governo anunciaram que haveria processos judiciais para prender e investigar um número indeterminado de funcionários. El Aissami declarou o seguinte nas redes sociais:

“Em virtude das investigações que foram iniciadas sobre graves atos de corrupção na PDVSA, tomei a decisão de apresentar minha renúncia como ministro do Petróleo, com o objetivo de apoiar, acompanhar e apoiar plenamente este processo” e, em uma segunda mensagem, prosseguiu: “Da mesma forma, na minha qualidade de militante revolucionário, coloco-me à disposição da direção do PSUV para apoiar esta cruzada que o Presidente @NicolasMaduro empreendeu contra os antivalores que somos obrigados a combater, mesmo com as nossas vidas.”

Nesta mesma oportunidade, El Aissami colocou uma foto de Nicolás Maduro como a foto de perfil em suas redes e nunca mais postou algo ou mesmo foi visto publicamente.

No dia 21 de março de 2023, o regime venezuelano anunciou mais três prisões de pessoas ligadas a El Aissami, que além da acusação de “corrupção administrativa e desvio de fundos”, também iriam responder por envolvimento em uma rede de prostituição. O gabinete de Maduro declarou que iriam perseguir quem estivesse utilizando o grande Estado da Venezuela para enriquecimento próprio.

O ex-ministro de Chávez, Andrés Izarra, disse que o verdadeiro motivo do expurgo não tem absolutamente nada de elevado moralmente ou de luta “pelo povo”. Segundo Izarra, o que estava acontecendo “é uma disputa de poder” entre Maduro e um dos homens mais importantes do regime: Tareck El Aissami. Izarra, que está “exilado” na Alemanha, sem poder retornar ao seu país, deu a seguinte declaração: “Tareck El Aissami, que era o ministro do petróleo até agora e que acaba de renunciar, era uma pessoa de grande poder dentro da estrutura do madurismo. Não só foi presidente da PDVSA, que lhe deu muito acesso aos principais recursos que o país tem, como também controlou uma importante estrutura política. Tinha vários governadores que eram da equipe dele, ministros… Ou seja, ele controlava o poder dentro do Executivo, poder econômico, serviços de inteligência, corpos armados…”

Izarra, também destacou que El Aissami possui importantes relações internacionais, principalmente com o russos, turcos, sírios e o Hezbollah. O ex-ministro frisou que Maduro sempre permitiu que seu círculo íntimo se beneficiasse da estrutura criminosa que montou desde sua chegada ao governo, “mas o que Maduro não permite é que eles disputem o poder”.

Nos últimos dias, o procurador-geral do regime chavista, Tarek William Saab, apresentou áudios que colocam no complô quatro membros da oposição venezuelana, ligados a conversas Tareck El Aissami. Sendo estes membros: Leopoldo López, Julio Borges, Carlos Ocariz e Carlos Vecchio. O objetivo teria sido, segundo o procurador da ditadura, realizar “operações ilegais de petróleo” que favoreceram os já citados líderes do extinto governo interino de Juan Guaidó em cumplicidade com a facção do regime liderados por El Aissami.

Leopoldo Lopez, um dos mais conhecidos opositores do chavismo e exilado político, confirmou os contatos dizendo: “sim, tive conversas com muitas pessoas do regime para construir uma ponte para a transição para a democracia”. Lopez, ainda, recomenda que todas as conversas sejam divulgadas, ao garantir que “há muitas pessoas que hoje estão alinhadas na estrutura de poder da ditadura que também estão, estiveram e continuam a estar interessadas em provocar mudanças na Venezuela”.

Nos áudios, Samark López, alegado testa-de-ferro de El Aissami, afirma que não falava apenas em nome do ex-vice-presidente, mas também em nome de outra pessoa que estava construindo pontes para a saída de Maduro. O ex-Procurador do Ministério Público, Zair Mundaray questionou em sua conta no X: “[nos áudios] Cada vez que ele mencionava o personagem suprimiam o áudio da conversa. Quem é essa pessoa? Por que impedem que o nome seja conhecido? Quão perto ele está do poder? Já existem alguns vazamentos de quem poderia ser. O que o poder fará com o que eles sabem agora? Isso fica interessante!”

Fato é que este caso se arrasta desde o início do ano passado, como já referenciado em artigo que publiquei em meados de 2023, mas somente agora, as vésperas da eleição presidencial, marcada para julho deste ano, Maduro decide publicizar o complô contra sua ditadura. Os motivos para isto não são claro, mas é natural relacionar estes interesses da cada vez mais impopular ditadura venezuelana.