Em abril deste ano, a Fundação Biblioteca Nacional enfrentou problemas técnicos causados pela ação de hackers. Triste notícia para um país tão carente do conhecimento de suas memórias e obras literárias, muito pouco propagadas e desenvolvidas. A Biblioteca Nacional é o órgão responsável pela execução da política governamental de captação, guarda, preservação e difusão da produção intelectual do País. Com mais de 200 anos de história, é a mais antiga instituição cultural brasileira.
E por falar em bibliotecas enfrentando perigos e destruições, logo ali, além mar, ainda em terras lusitanas, a chamada Biblioteca Real foi totalmente destruída no terremoto, maremoto e incêndio ocorridos em Lisboa no dia 01 de novembro de 1755. Cabia ao rei D. José I (1714-1777) o grande desafio de reconstruir Lisboa incluindo o acervo de sua Biblioteca, considerada na época uma das mais importantes da Europa.
Foi da reconstituição da Livraria Real de D. José, organizada sob a inspiração de Diogo Barbosa Machado, abade de Santo Adrião de Sever, que nasceu o primeiro acervo de nossa Biblioteca.
Em 27 de novembro de 1807, em função da invasão das tropas de Napoleão a Portugal, D. João VI parte com sua família para o Brasil. Entre, joias, louças, mapas, documentos de Estado e outros bens de valor que conseguiram embarcar nos navios que deixaram Lisboa, faltou, porém, uma remessa muito importante de itens: os caixotes de livros, documentos, gravuras e outras preciosidades da Real Biblioteca. Estes itens ficaram no porto, e posteriormente retornaram ao Palácio da Ajuda.
Somente a partir de 1810, os caixotes preparados em 1807 começaram a chegar ao Rio de Janeiro, o que se estendeu por mais duas levas até o ano seguinte.
Por decreto de 27 de julho de 1810, a primeira remessa do acervo de livros foi acomodada nas salas do Hospital da Ordem Terceira do Carmo, na Rua Direita, hoje Rua Primeiro de Março. Em 29 de outubro de 1810, data oficial da fundação da Biblioteca, um novo decreto determinava que nas catacumbas do Hospital do Carmo se erija e acomode a Real Biblioteca e instrumentos de física e matemática, fazendo-se à custa da Fazenda Real toda a despesa conducente ao arranjo e manutenção do referido estabelecimento”.
Com o bibliotecário Luís Joaquim dos Santos Marrocos, chega ao Rio de Janeiro, em junho de 1811, o segundo lote de livros da Real Biblioteca e em novembro de 1811, com José Lopes Saraiva, chegam os últimos 87 caixotes.
A Real Biblioteca foi ampliando seu acervo por meio de doações e aquisições e em 1814 houve a abertura ao público para consultas, que antes era restrita apenas a estudiosos, mediante consentimento régio.
Com o início da Revolução do Porto (1820) e a solicitação dos portugueses, D. João VI retorna a Portugal em 1821, levando parte dos manuscritos da coroa portuguesa e deixando como prefeito da Real Biblioteca o bibliotecário Luís Joaquim dos Santos Marrocos, que permaneceu no cargo até 1825, quando A Biblioteca é adquirida pelo Brasil, por 800 contos de réis, quantia considerada exorbitante. A compra foi regulamentada pela Convenção Adicional ao Tratado de Paz e Amizade, celebrado entre o Brasil e Portugal, em 29 de agosto de 1825.
Em 1822 a Biblioteca passa a crescer também por meio de uma determinação do governo imperial: a Biblioteca passava a receber um exemplar de todas as obras, folhas periódicas e volantes impressos na Tipografia Nacional, fato precursor do que hoje é a Lei do Depósito legal. Neste ano também a Biblioteca ganha novo nome. A Real Biblioteca passa a ser denominada Biblioteca Imperial e Pública.
Com a proclamação da República em 1889, D. Pedro II retorna a Portugal e, antes de partir, doa um conjunto de aproximadamente 100 mil obras, que pede que seja denominado “Collecção D. Thereza Christina Maria”, em homenagem à imperatriz, sua esposa. É a maior doação já recebida e sua chegada demandou reformas e criação de novos espaços no prédio para comportar o acréscimo no acervo.
A coleção reúne livros, publicações seriadas, mapas, partituras, desenhos, estampas, fotografias, litografias e outros documentos impressos e manuscritos.
Em 1905 é lançada a pedra fundamental do atual prédio da Biblioteca Nacional, localizado na majestosa Avenida Central, hoje Avenida Rio Branco. Antes disso, desde 1858, a Biblioteca ocupou a rua da Lapa, atual Rua do Passeio, prédio que atualmente abriga a Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.
Em 1876 a instituição passa a se chamar definitivamente Biblioteca Nacional, depois de ser denominada de Real Biblioteca e Biblioteca Imperial e Pública.
Em 1910 é inaugurado o novo prédio da Biblioteca Nacional, exatamente 100 anos depois da fundação e instalação da instituição na Rua Direita. Projetado pelo construtor e engenheiro general Francisco Marcelino de Souza Aguiar, o edifício tem capacidade para um milhão e meio de livros impressos e todo o acervo de manuscritos, estampas etc. Possui salas de leitura e estudo para o público, divisões e gabinetes de trabalho para o pessoal da administração e outras dependências. O edifício da Biblioteca Nacional é uma atração à parte, tem estilo eclético, no qual se mesclam elementos neoclássicos e de art nouveau.
Atualmente, a Fundação Biblioteca Nacional conta com um acervo de aproximadamente 9 milhões de itens, é considerada uma das 10 maiores bibliotecas do mundo e a maior biblioteca da américa latina
Para garantir a manutenção desse imenso conjunto de obras, a BN possui laboratórios de restauração e conservação de papel, oficina de encadernação, centro de microfilmagem, fotografia e digitalização. Digitalizar as obras, principalmente as mais antigas e raras é de extrema importância para ao mesmo tempo preservar o acervo e mantê-lo disponível às pessoas.
A Biblioteca Nacional tem desenvolvido um trabalho sensacional de divulgação de seu acervo e de aproximação com a população em geral, disponibilizando suas obras também por meio digital. Imaginem quantas histórias, fotografias e informações interessantes temos disponíveis em nossas mãos. Seguindo as redes sociais da Biblioteca Nacional ou acessando a Biblioteca Nacional Digital temos a oportunidade de incluir um pouco de literatura e história em nossas vidas de forma bem divertida. Suspeito que não irá se arrepender!
Referências:
Dom João VI e a Biblioteca Nacional: um legado em papel, Ismênia de Lima Martins
História de Portugal, Bernardo Vasconcelos e Sousa e Nuno Gonçalo Monteiro
A longa viagem da biblioteca dos reis, Lilian Moritz Schwartz
Muito bom, texto muito bem escrito👏👏
Bom tenho o privilégio, mesmo em meio a minha ignorância, ter utilizado o espaço de leitura desta magnífica biblioteca, no período que estudei já escola técnica CEFET. Pena não ter utilizado o tempo para ler obras que provavelmente iriam enriquecer meu intelecto. Mas não é tarde, pois ainda vivo!!
Oi, bom dia!
É uma delícia ler textos tão bem escritos; pena tamanha raridade. Parabéns à Autora!