Embora sempre houvessem cidadãos de direita no Brasil, podemos considerar a organização do espectro político no país como um “bebê” em fase de crescimento e formação. Muitas das ideias deste âmbito são abraçadas por boa parte dos seus adeptos – Estado mínimo, soberania nacional, entre outros.

Porém, se por um lado é louvável que que haja um crescimento no contraponto (já que o país nunca viveu uma pluralidade de fato, apenas o famigerado “teatro das tesouras”), por outro não há o crescimento do conservadorismo. Muitos pensam que ser de direita e ser conservador é a mesma coisa, contudo explicarei aqui que não é desta forma.

O motivo de trazer este assunto à baila é a preocupação pessoal que tenho com pessoas – de boa índole, quero registrar – mas que, por falta de uma leitura mais aprofundada, acabam por defender ideias estapafúrdias. Sempre defendi que o ativismo político deve andar de mãos dadas com os estudos, pois é nossa obrigação saber pelo que exatamente estamos lutando.

Um amigo meu estava comentando sobre a direita se utilizar de métodos revolucionários para atingir seus objetivos. Eis o que ele recebeu como comentário: Então Revolução só pode ser feita por comunistas? Assim como o Vermelho é a cor que só comunista pode achar bonito?” Eu quase caí da cadeira, de tão estarrecida que fiquei ao ler tamanho absurdo. Por isso, me propus a escrever, nas linhas que se seguem, semelhanças e diferenças entre conservador e direitista, além de explicar que um conservador não faz revolução.

Sobre conservadorismo, apelo para o filósofo número um da minha assembleia de vozes, Sir Roger Scruton. Na obra “Como ser um conservador”, ele diz: “O negócio do conservadorismo não é corrigir a natureza humana ou moldá-la de acordo com alguma concepção ideal de um ser racional que faz escolhas. O conservadorismo tenta compreender como as sociedades funcionam e criar o espaço necessário para que sejam bem-sucedidas ao funcionar.” Baseando-se na obra de Hegel, “Fenomenologia do espírito”, Scruton explica que as relações de conflito são superadas pelo reconhecimento de direitos e deveres mútuos, e assim, o indivíduo adquire um senso de valor próprio e dos demais; é como diz aquela frase clichê, mas verdadeira: “O mal que não quero para mim não quero para ninguém”.

O filósofo diz que nossa condição como cidadãos é possível graças aos vínculos afetivos duradouros às coisas que nos são caras. E então, ele cita a frase mais importante: “Somos criaturas que constroem lares, em busca de VALORES INTRÍNSECOS…” Estes valores surgem a partir da cooperação social.

Partindo da premissa que o conservador busca valores, invoco outro grande filósofo, Edmund Burke. No clássico “Reflexões sobre a revolução na França”, Burke escreve: “Quando os homens de posição sacrificam todas as ideias de dignidade por uma ambição sem objeto distinto e lidam com baixos instrumentos para baixos fins, toda a sociedade torna-se baixa e vil”. Ou seja: de que adianta ter nobres fins utilizando-se de quaisquer meios?

E é aqui que conservador e direitista se separam muitas vezes. O primeiro SEMPRE colocará os VALORES INTRÍNSECOS na frente ao tomar decisões; o direitista, nem sempre. Este olhará APENAS para a política do dia, sem se atentar em como a situação chegou até aquele ponto. Podemos colocar assim: enquanto o direitista pensa no “aqui e agora”, o conservador o faz a longo prazo.

Peço encarecidamente para não me jogarem pedras, afinal, também sou direitista, mas não APENAS. Eu, como conservadora, antes de tecer qualquer juízo, coloco os valores – citados por Scruton – à frente, apenas isso. Uma direita que não possui valores será facilmente cooptada por qualquer preço, e, como ouvi recentemente do deputado Marcel Van Hattem, “Uma pessoa que tem preço logo perde seu valor.”

Voltando ao questionamento que meu amigo recebeu: Então Revolução só pode ser feita por comunistas?”, respondo: ela é feita por todos aqueles que não possuem valores e que sacrificam sua dignidade lidando com baixos instrumentos para atingir seu objetivo, por mais “nobre” que seja. Agora, por que muitos direitistas, embora pessoas de boa índole, muitas vezes teimam em recorrer à métodos revolucionários? Porque não estão atentos ao que Scruton chama de “esferas de valor”.

Lembrando do que foi dito anteriormente, os valores surgem a partir da cooperação social, e isso se dá através das tradições, costume e das instituições que promovem a responsabilidade mútua. E a primeira delas é a religião – mais especificamente, o cristianismo.

Todas as revoluções consideram o cristianismo seu inimigo mor; Marx escreveu em “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel”: “A crítica da religião liberta o homem da ilusão, de modo que pense, atue e configure a sua realidade como homem que perdeu as ilusões e reconquistou a razão (…) A religião é apenas o sol ilusório que gira em volta do homem enquanto ele não circula em tomo de si mesmo.” Para os revolucionários, religião é atraso, retrocesso. Contudo, é ela que nos dá o limite moral para convivermos em sociedade – seja diretamente, através da nossa frequência à igreja, seja indiretamente, através do cumprimento das leis. Ou há quem ache que “Não roubarás” foi criado por algum ministro do Supremo?

Apelando novamente para Scruton, dessa vez através da obra “As vantagens do pessimismo”, ele explica: “Sem limitações morais, não pode haver cooperação, nenhum compromisso familiar, nenhuma perspectiva de longo prazo, nenhuma esperança da ordem econômica e muito menos da ordem social.”. Trocando em miúdos: não se pode resolver problemas criando mais problemas, pois é esse o resultado da apelação aos métodos revolucionários.

Não, nem conservador, nem cristão, nem pessoa que se utilize dos neurônios dados por Deus faz revolução, por entender que os males advindos de tais métodos seriam piores do que o problema em si; além disso, o cristão sabe que espírito de revolução provém daquele que se rebelou e foi expulso dos céus. E encerro com Burke: “Quando a indústria e as manufaturas faltam a um povo, mas restam o espírito de nobreza e religião, o sentimento supre seu lugar, e nem sempre são mal supridos; mas se o comércio e as artes se perdem em um experimento para testar quão bem um Estado pode ficar sem esses antigos princípios fundamentais, que tipo de nação será essa, de bárbaros, brutos, estúpidos, ferozes, e, ao mesmo tempo, pobres e sórdidos, destituídos de religião, honra e orgulho viril, se possuir nada neste momento e sem esperar nada do porvir?”