Há duas grandes afetações quanto a este assunto: uma é achar que tudo é questão de gosto, outra é ter certeza de que tudo é questão de ser bom ou ruim. Antes de prosseguir, preciso ressaltar que a análise trata apenas dos textos imaginativos: ficção, romances, dramas, poemas, etc.
O PHVox depende dos assinantes, ouça o áudio abaixo. Conheça os benefícios, Assine!
“Não somente dirão que gostam ou desgostam do livro, mas por quê”. Essa frase é proferida por Mortimer Adler, em A Arte de Ler, e é a chave para a resolução de nosso problema. A leitura imaginativa é para descrever o que seria indescritível por outras formas de escrever. Apesar de poder instruir, seu objetivo principal é dar prazer, criando novos mundos, com leis universais diferentes ou não, com mais semelhanças com a realidade ou puramente fantasia, que seja.
Adler acrescenta em sua obra: Ninguém pode discordar do gosto alheio. A autoridade absoluta de seu próprio gosto é prerrogativa do homem. Mas pode-se discordar desse gosto, quando o que se discute é o valor de um livro.
Metade de nossa questão podemos considerar respondida pelas palavras de Adler. Sim, gostos diferentes existem, somos pessoas distintas e com diversidade de preferências. Mas a crítica literária não se faz apenas de gosto. Posso gostar ou não de uma obra, mas devo, para ser honesto, responder à questão proposta acima: mas por quê? Pelos sentimentos que me evocaram? Pela unidade da narrativa? Pelo lirismo exato do poeta? Pela estética da obra? Pelas experiências que me acrescentaram? Por quê? Eis a questão primordial.
É muito importante entendermos nossos próprios gostos, conhecer as virtudes artísticas do trabalho intelectual e, não menos importante, ter consciência de nossos preconceitos. Se eu não gosto de fantasia, não quer dizer que eu não possa assumir que uma obra seja boa, por várias razões artísticas. Percebem que no fundo as coisas não estão tão relacionadas assim? Posso até mesmo gostar de um livrinho que me toca, que comunica às minhas moelas, mas mesmo assim tecer críticas legítimas quanto a narrativa ou a forma que o autor o fez.
Um dos grandes problemas de quem lê esse tipo de literatura é querer encontrar “uma mensagem”, uma doutrina, uma filosofia oculta. E isso é um erro tremendo. Outro erro é querer comparar o universo criado pelo autor com o “universo real”. Cada obra imaginativa é um universo em si, e é preciso ter sempre isso em mente.
Então, sejamos todos honestos. Por que não gostamos de tal obra? (Precisamos responder) Teria você competência para, além de dizer — de modo pessoal — se gosta ou não, fazer críticas à arte de forma aprofundada? Começar respondendo o motivo de gostar ou não já é um grande começo para compreender a crítica literária. Podemos também recorrer a bons críticos, alguns de gostos até parecidos com os nossos, pois sim, há muitos livros ruins que não merecem ser lidos, e os critérios são diversos e complexos. Boa sorte, e boas leituras!
Adendo: o gosto é apenas uma das formas de juízo. Você pode julgar uma obra pelo caráter moral dela, pelas intenções do artista, pelos valores que passa, pela técnica utilizada em seu contexto histórico, pela originalidade ou mímese, pelas críticas dos pares, referências evocadas, pelos impactos sociais, etc.