A polêmica envolvendo Elon Musk, a plataforma X (antigo twitter), o Ministro Alexandre de Moraes e o congresso dos Estados Unidos da América levantou um debate que tomou as redes sociais: “Se o STF do Brasil Banir o X é censura, por que os Estados Unidos banir o TikTok não é?”.

A discussão em torno da liberdade de expressão tomou conta do Brasil nas últimas semanas, se por um lado o judiciário brasileiro é acusado de restringir liberdade e até mesmo de implementar uma ditadura judicial, por outro, é defendido com gana, principalmente por setores da esquerda nacional.

A lista de países, potencialmente aliados da China, que proíbem parcial ou totalmente o aplicativo, incluem: Afeganistão, Irã, Paquistão, Rússia e por incrível que pareça, a própria China. O TikTok em dispositivos trazidos para a China continental não funciona nas redes locais, exigindo o equivalente chinês Douyin. Sendo esta posição do governo chinês, um forte indicativo para agências de inteligência que a função de espionagem e também a de subversão cultural do aplicativo seja verdadeira.

Mas a principal preocupação internacional, além da coleta ilegal de dados, arquivos e informações dos usuários, é quem estaria utilizando estas informações. A resposta pode ser preocupante: O Partido Comunista Chinês.

Em 20 de agosto de 2021, foi aprovada na China a lei de Proteção de Informações Pessoais (PIPL, na sigla em inglês) pelo Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo, entrando em vigor em 1 de novembro de 2021. A lei assume um importante papel jurídico, visto que a intenção do Congresso chinês, com sua redação, foi a de tornar gerais todas as questões sobre informações pessoais. Por esse motivo, desde o momento em que a lei passou a produzir os seus efeitos, a China tornou-se um dos países com maior rigor e regulamentação na esfera de proteção dos dados pessoais. Apesar de ter diversas semelhanças com leis como a do Brasil e da União Europeia, existe uma diferença fundamental: enquanto as legislações brasileira e europeia abordam a privacidade como algo central de seus textos, a PIPL não trata diretamente sobre ela, uma vez que, para a legislação chinesa, a privacidade tem um conceito, digamos, amplo.

Mas, na prática, o que isto significa? Tomando como exemplo os Estados Unidos, o governo pode solicitar de uma empresa privada como a Apple, o desbloqueio de um dispositivo pessoal ou acesso a conversas e dados privados de um usuário. Porém, estas empresas possuem respaldo jurídico para negar o acesso a estes dados para o seu governo ou de qualquer outro país. O que já levou inclusive a um embate judicial entre a própria Apple e o FBI. Com a lei chinesa, a situação é completamente oposta, pois ela obriga a cessão de quaisquer dados ou informações por empresas que possuam participação chinesa para o governo controlado pelo partido Comunista Chinês, com um detalhe importante: dentro ou fora da China.

Em novembro de 2022, o TikTok reconheceu publicamente pela primeira vez que os dados de seus usuários europeus podem ser acessados, “conforme necessário pelo serviço”, por funcionários em vários países, incluindo a China. O comunicado continua: “funcionários selecionados do nosso grupo localizados no Brasil, Canadá, China, Israel, Japão, Malásia, Filipinas, Cingapura, Coreia do Sul e Estados Unidos”, disse Elaine Fox, diretora de privacidade do TikTok na Europa.

No último dia 23 de abril de 2024, o Senado dos Estados Unidos aprovou um projeto de lei que, semelhante com o decretado por Trump, a ByteDance será provavelmente forçada a cortar seus laços com a controladora de propriedade chinesa, com o não cumprimento podendo gerar o banimento em todo o país.

Desta forma, podemos concluir que a comparação dos casos envolvendo o X de Elon Musk no Brasil, com o TikTok nos EUA, não possuem equivalência comparativa e trata-se de questões profundamente diferentes. Não sendo possível assumir este discurso para validar ou não o embate que a empresa trava com o judiciário brasileiro sob a observação dos congressistas americanos.

A comissão de Assuntos Judiciários da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos publicou no dia 17 de abril de 2024 um relatório que acusa o Ministro Moraes de censurar qualquer oposição brasileira com uma plataforma crítica ao atual governo de esquerda, em referência ao Presidente Luis Inácio Lula da Silva. O relatório contém diversos documentos, até então sigilosos no Brasil, que foram entregues a pedido de Elon Musk aos parlamentares americanos. A tensão entre usuários da rede aumentou com o risco de esta ser suspensa em território nacional. Diversos usuários, porém, levantaram a questão, alegando estarem tratando da soberania nacional: “Banir o Twitter é censura, mas os EUA banir o TikTok não é? Isso é Hipocrisia!”.

A questão não é tão simples e fechada como parece:

O TikTok pertence à empresa chinesa ByteDance, que também controla toda a operação de dados distribuídos pelos usuários na plataforma. Em 2020, o então Presidente americano Donald Trump, por ordem executiva, que a ByteDance deveria vender a sua participação na empresa, não tendo a operação chinesa nenhuma ligação com a plataforma nos EUA. Empresas como a Microsoft, Walmart e Oracle foram ventiladas para serem as novas acionistas do aplicativo. A própria ByteDance havia concordado com os termos.

Com o resultado das eleições americanas de 2020, o agora Presidente Joe Biden revogou a ordem executiva de Trump em junho de 2021, alegando ser necessário utilizar “uma abordagem baseada em evidências”.

Esta preocupação com a plataforma, porém, não é exclusividade do governo americano. Diversos governos pelo mundo já demonstraram preocupações e baniram o uso do TikTok em instalações do governo e militares, bem como em dispositivos que contém dados sensíveis. Esta lista inclui:

Áustria, Bélgica, Dinamarca, Estônia, França, Irlanda, Letônia, Malta, Países Baixos (Holanda), Noruega, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia.

Além desta preocupação com a espionagem de dados realizada pelo aplicativo em dados do smartphone do usuário, existe uma preocupação com o conteúdo gerado pela plataforma e a sua finalidade. Muitos analistas apontam que o TikTok foi planejado como uma arma de subversão ideológica e psicológica, fato apontado até mesmo por figuras inesperadas no cenário político internacional, como o Presidente francês Emmanuel Macron, que declarou em 2022 que o TikTok promove o vício entre jovens online. Em 2019, o Judiciário da Índia pediu ao governo o banimento da plataforma, alegando que ele “incentiva a pornografia” e mostra “conteúdo impróprio”. O tribunal também observou que os menores que usam o aplicativo arriscam serem alvo de predadores sexuais.